terça-feira, 3 de novembro de 2009

Foucault, Michel


O filósofo francês, Paul-Michel Foucault, nasceu em 15 de outubro de 1926 em Poitiers. Pertencia a uma família de tradição médica. Filho, neto e bisneto de médicos, no entanto, Michel não demonstrou interesse pela medicina e sim pela história influenciado por um professor que teve ainda na escola, padre De Montsabert, aos onze anos de idade, surpreendendo os mais velhos que davam por certo que ele seguiria a tradição familiar sendo cirurgião. Contudo, o menino, decidiu ser professor de história e transformou-se em um dos escritores que mais profundamente refletiram sobre a história, um poeta do pensamento e um narrador teórico. E apesar de Foucault não seguir carreira na medicina sempre manteve uma relação privilegiada e ao mesmo tempo marcada por uma desconfiança essencial com a mesma.

O sofrimento fez-se presente na vida do filósofo desde a infância. Michel e o pai tinham uma relação conturbada. O fato de pertencer a uma família burguesa, puritana provincial das décadas de 30 e 40 de forte tradição católica por parte paterna regia até os mínimos detalhes da vida cotidiana, o que dificultou e traumatizou o jovem rapaz que havia descoberto sua atração por homens e não sabia como lidar com o fato, não tinha a quem recorrer e não sabia como viver. O jovem sofreu grande pressão por ser homossexual, principalmente por parte paterna, e disse pouco antes de morrer, que quando pequeno, seu pai queria acabar com seu “problema” de homossexualidade o submetendo a uma das salas de cirurgia. A partir daí sua vida tornou-se um caos e fez com que, até meados de seus vinte anos, tentasse por várias vezes o suicídio e tempo em que adquiri uma afeição pelo álcool. Esta experiência traumática o aproximou da psicologia, psicanálise e psiquiatria, as quais iram influenciar imensamente sua obra.

Foucault era muito curioso fato que o impulsionou a buscar por conta própria suas leituras e que o ligou à filosofia. Por sobreviver ao escândalo de assumir sua orientação sexual num tempo que considerava esta uma doença ou uma forma de degeneração moral, acabou ajudando e fortalecendo Michel para encarar os combates intelectuais que o aguardavam, não menos sarcásticos e ferozes que as cruéis brincadeiras que enfrentara em sua juventude.

Em 1945 mudou-se para Paris onde se preparava para concorrer a vagas como aluno na École Normale da rue d'Ulm. Nesse período Foucault entra em contato com o professor Jean Hyppolite, importante filósofo que trabalha hegelianismo na França e que o marcara profundamente. Iniciando seus estudos na École Normale da rue d'Ulm em 1946. O convívio competitivo por parte dos alunos desta escola só fez aumentar seu comportamento de isolamento social; trazia consigo a aparência de uma pessoa solitária e fechada. Por toda sua vida, esse distanciamento social, o influenciou, tornando-o uma pessoa agressiva e irônica. Uma das lembranças mais amargas de sua juventude está ligada com a luta pela primazia na escola, o que o levou a sobressair-se desde o início de sua carreira universitária e torná-lo “a promessa de sua geração”.

Foi leitor de Kant, Platão, Nietzsche, Hegel, Marx, Husserl, Heidegger, Freud, Lacan, Bachelard, etc. “Brilhante em uma geração de homens brilhantes” destacando como companheiros de estudos e amigos: Pierre Boulez, Gilles Deleuze, Pierre Bourdieu, Roland Barthes e Paul Vayne; e como seus professores: Jean Hyppolite, Louis Althusser, Maurice Merleau-Ponty, Georges Dumézil, Georges Canguilhem. Ficou muito amigo de Louis Althusser quem o aproximou da política levando-o a aderir ao partido comunista. Mesmo que alinhado a esquerda, sua posição não era nada ortodoxa, suas posições políticas escandalizaram tanto aos conservadores quanto aos progressistas, e nas disputas que a esquerda e a direita mantinham durante os quentes anos da Guerra Fria não foi inesperado seu afastamento do comunismo tão rápido como seu ingresso. Foucault, apesar de um acadêmico de prestígio, era “elitista”, um homem que “renegou” Marx, sendo qualificado pela maioria esquerdista como “violentamente anticomunista”.

Michel considerava que sua filosofia era uma crítica a Kant, porque para ele o homem é produto das práticas discursivas já para Kant o sujeito é mediador e referência de todas as coisas. Sofreu grande influência de Heidegger em sua obra ao afirmar: "Todo o meu devir filosófico foi determinado por minha leitura de Heidegger". E, também, influenciado por Bachelard, Sartre (com quem levou muito tempo para reconhecer a dívida que tinha com sua obra) e Nietzsche, por quem tinha imensa admiração e paixão. A obra de Friedrich Nietzsche, em especial os textos escritos à beira da loucura, foram a luz e sustentação para Foucault que enxergou neste tanto o poeta quanto o filósofo, o artista quanto o pensador, e ajudou-o a compreender que ter um ponto de vista original não era um pecado pelo qual se devesse pagar caro. Para ambos (Foucault e Nietzsche) a forma, o tom poético que percorre suas escrituras e o apelo ao aforismo nunca foram questões secundárias. Há um par de aforismos nietzscheanos que lhe serviram quase como mantras para uma meditação pessoal, o primeiro que marcou cada momento de sua vida, ele o parafraseava: “Trata-se de chegar a ser o que se verdadeiramente é”. O segundo diz: “O amor à verdade é terrível e poderoso”. Também foi leitor de René Char, Kafka, Faulkner, Genet, Sade, Gide, etc.

“Foucault é o mais literário dos filósofos e o mais filosófico dos escritores”. Valia-se da árdua tarefa de expressar idéias extremamente perigosas e complexas através de paradoxos magníficos e sutilezas estilísticas. Muitas de suas referências “teóricas” são literárias, desde a inclusão de multinarrações que são essenciais para o desenvolvimento do argumento até o trabalho com a escritura, não sendo por acaso que no começo de “As palavras e as coisas”, por exemplo, diga que a pesquisa do livro tenha surgido de um fragmento do ensaio de Jorge Luis Borges Outras inquisições: “O idioma analítico de John Wilkins”. Em 1961 defendeu sua tese de doutorado e apresentou duas: a primeira intitulada a “História da Loucura”, a segunda intitulada “L'Anthropologie de Kant” e foram apresentadas por D. Lagache e Georges Canguilhem respectivamente. Pela “História da Loucura”, o filosofo, foi chamado de “intelectual absoluto, fora do tempo” pelo jornal Le monde. É neste livro fundacional que Foucault insiste em “pensar a loucura em sua especificidade, não como uma essência imutável que se manteria através do tempo e as culturas, mas que é própria de cada momento histórico, de cada contexto, cultural, social e econômico”. No final deste ano, acaba de escrever “O nascimento da clínica” que ele apresenta como “as sobras da História da Loucura” e no qual usa pela primeira vez o termo estrutura, demonstrando neste texto a intenção de realizar uma analise estrutural. A medicina passa a ocupar um lugar central em seu pensamento, porém, vista a partir de uma critica da medicina em sua “essência”, ou seja, o saber médico é negativo por si próprio, principalmente quando acerta, porque ver a doença como algo a combater abre caminho a novas enfermidades de difícil controle.

“As palavras e as coisas”, seu livro mais difundido, foi publicado em 1966. Neste Foucault queria desmontar o mecanismo de naturalização do pensamento, isto é, uma tentativa de eternizar (ou quase) conceitos, problemas e soluções cientificas através de um mecanismo, já que o pensamento é tido como fora da história, conclui em sua investigação: “Uma coisa em todo caso é certa: é que o homem não é o mais velho e nem o mais constante problema que se tenha colocado ao saber humano (...) O homem é uma invenção cuja recente data a arqueologia de nosso pensamento mostra facilmente. E talvez o fim próximo. Se estas disposições viessem a desaparecer tal como apareceram, se, por algum acontecimento de que podemos quando muito pressentir a possibilidade, mas de que nesse momento não conhecemos ainda nem a forma nem a promessa, se desvanecessem, como aconteceu, na curva do séc. XVIII, como solo do pensamento clássico – então se pode apostar que o homem se desvaneceria, como, na orla do mar, um rosto de areia”.

No inicio da década de 70 realiza sua primeira viagem aos Estados Unidos. Conquistando, a partir daí, o mundo intelectual, e ao mesmo tempo em que chega a Berkeley aproxima-se das drogas e de experiências sado-masoquistas passando a voltar seu trabalho sobre a problemática do poder e da relação entre saber e poder. Foucault escreve um artigo criticando a distinção feita por Althusser em seu artigo publicado em “La Pensée” que dizia que os aparelhos do Estado se diferenciam de acordo com o funcionamento da violência ou pela ideologia. Dessa crítica Althusser nasce mais um de seus livros: “Vigiar e Punir”. Concomitantemente funda o Grupo de Informação sobre Prisões (GIP) com intuito de intervir na realidade. Passa a escrever sobre as prisões e tem por questão central o por que das prisões exercerem tamanha fascinação social, mesmo dizendo respeito a uma população minoritária? Chegando a dizer: “Todas as violências e arbitrariedades são possíveis na prisão, mesmo que a lei diga o contrário, porque a sociedade não só tolera, mas exige que o delinqüente sofra”.

Em 02 de dezembro de 1970, Foucault, dá sua primeira aula no Collège de France, expondo questões sobre o poder e, por 13 anos, exporá suas pesquisas, todas quartas feiras, às 17:45h. O primeiro curso tem por tema: “A vontade de saber”, contrapondo os modelos teóricos de Aristóteles e Nietzsche. Depois dá abertura a todos temas e formas de abordagem (período de grande aprendizagem e de elaboração apaixonada). Em 1977, quando volta do Irã, cria nova polemica uma de suas frases: “Há mais idéias no mundo que as que imaginam os intelectuais”. Em seus últimos dez anos de vida sua experiência californiana foi essencial e em Berkeley ensinou (e pesquisou). Já em Los Angeles, aparece um Foucault mais intenso, porém, menos difundido nas universidades, pois acedeu a práticas sado-masoquistas em saunas gays que, o permitiram desenvolver uma reflexão original sobre o gozo por meio da dor. Depois de percorrer um longo caminho, em suas investigações dos anos 1970, apesar do seu interesse pela sexualidade parecer óbvio, refletido em sua última obra, História da sexualidade, não o é de fato. Para Foucault, foi um problema chegar a pensar o sexual perguntando-se, em primeiro lugar, por que a sexualidade é objeto de uma preocupação moral, mas vai além de uma questão moral, está claro que alguém, alguma instituição, um poder necessita que o sexo seja supervisionado pela moral.

No pensamento de Foucault, o homem ocupa um papel importante, uma vez, que é sujeito e objeto de conhecimento. Considera o homem enquanto resultado de uma produção de sentido, de uma prática discursiva e de intervenções de poder, o vê como sujeito e objeto do conhecimento, através de três procedimentos em domínios diferentes: a arqueologia: diz sobre “saberes que falam sobre o homem, as práticas discursivas, e não verdades em relação a este homem”. Reivindica uma independência de qualquer ciência, pois acredita não poder localizar o homem através do que ela pode oferecer (encontrada, principalmente, em duas de suas obras: "A História da Loucura" e "As palavras e as Coisas"); a genealogia: que possibilita pensar na questão do poder como uma rede onde o homem é visto como objeto e sujeito das práticas do poder (encontrado, principalmente, na obra “Vigiar e Punir”) e a ética: como a possibilidade de apontar o sujeito que constitui à si próprio como sujeito das práticas sociais e refletir o motivo pelo qual o homem moderno constitui critérios de um modo de subjetivação em que tenha espaço a liberdade (essa ética encontra-se fundamentada em “O uso dos prazeres” e “O cuidado de si mesmo”)

Michel Foucault morreu em 25 de junho de 1984, aos 57 anos, tinha aids em uma época em que a doença era rapidamente mortal e quando era o pensador mais famoso do mundo e sua obra havia aproximando-se de seu ideal de vida: chegar a ser o que verdadeiramente se é. Ainda que menos popular que Jean-Paul Sartre depois da Segunda Guerra Mundial, a filosofia foucaultiana transformou-se naquilo que Sartre desejou produzir, mas não chegou a articular: uma ética nascente de uma reflexão que se encontra nos antigos gregos, daí a consistência clássica presente em sua obra.

Por Luciane Martins Scaramel

4 comentários:

  1. Nunca vi individuo tão degenerado moral, um depravado sem regras, a letra o matou.
    Leu tanto e não aprendeu nada.
    A vida se resume em um único caminho, a saber: Se fazer sempre mais, não em demanda da "libertinagem" mas em busca da perfeição moral para culminar no mais alto patamar da ÉTICA.
    Ser libertino é ter moral?
    Se depravar em saunas de San Francisco é ter moral?
    Escreveu sobre a sexualidade, iniciando apenas do ponto onde ela se manifesta como desejo e solicitando a materialização do mesmo, nunca atinou, aliás nunca soube respeitar o principio de TUDO e por isso MORREU DE AIDS, eis ai fim dos incautos.

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