domingo, 1 de novembro de 2009

Tropicália e a Discussão do Papel da Arte na Sociedade

Na ditadura militar a arte teve papel fundamental nos movimentos políticos de esquerda para conscientizar o povo contra o regime. A atuação da União Nacional de Estudantes (UNE) na política do país se intensificou quando foi criado, em 1961, o Centro Popular de Cultura, que veio acolher artistas e universitários engajados em um movimento artístico revolucionário. Esse movimento criticava a arte que não fosse voltada para o popular, o que não fosse de acesso às massas, chamando essa de arte alienada.

No final da década de 60 surge o movimento tropicalista fundado por Caetano Veloso e Gilberto Gil querendo revolucionar a arte. Consideravam a arte proposta pelo CPC da UNE arcaica, onde adaptava a estética da bossa nova a outros estilos brasileiros e os aspectos dos discursos nacionalistas. O que a Tropicália pretendia era a junção do arcaico com o moderno, pegar a base da bossa nova e misturar a música brasileira com outras tendências. Além disso, o tropicalismo apresentava a modernidade trazida pela burguesia e pela ditadura. Ou seja, justamente o que a esquerda engajada criticava como arte alienada.

Além de Caetano e Gil, outros artistas como Cacá Diegues, Jorge Mautner, Waly Salomão etc. começaram a ser chamados de alienados por apresentarem uma arte subjetiva ao invés de uma arte que demonstrasse a realidade brasileira. Após levar duras críticas sobre o filme Xica da Silva, ao dar uma entrevista a O Estado de S. Paulo (31/08/78) sobre o lançamento do filme Chuvas de Verãoº, Cacá Diegues acusou a existência de "patrulhas ideológicas" criticando as "tentativas de supervalorização de um determinado produto cultural a partir de algumas características superficiais, aparentes, que fechavam com posições políticas".¹ Cacá Diegues em muitas outras entrevistas afirmava também que ele era um artista e por isso não tina a obrigação de confundir arte com política. Henfil, então, ao saber do depoimento do cineasta, começou a por críticas pesadas a ele abrindo uma briga entre "patrulheiros" e "patrulhados". Mais à frente, Henfil daria o nome de "patrulha odara" aos que exigiam atitudes apolíticas nas artes. Essa expressão foi dada devido a uma música de Caetano que dizia: "Deixa eu dançar/ Pro meu corpo ficar odara".

Mas o debate sobre o envolvimento entre arte e política não é recente. Malevich, grande artista do suprematismo russo, foi um dos que acolheram a revolução de 1917 na Rússia, mas, para ele, a arte não tinha um fim utilitário, o artista deve ser independente e sua arte não orientada para as ideologias sociais e políticas. Foi contra a submissão do artista ao Estado, pois, dizia ele, que o Estado "cria uma estrutura de realidade que passa a ser a consciência das massas" ² sendo essa uma arte voltada para a propaganda. A arte realmente não pode deixar de ser subjetiva e nem ser dogmática, como insistia Malevich. Porém, o artista não é uma ilha isolada do resto do mundo talvez como ele gostaria que fosse, ele também é parte de uma sociedade e contribui, ou pelo menos deve, contribuir para a sua organização e a partir disso é que o artista, apesar de ter a sua independência na obra, deve ter a responsabilidade com a arte que é propalada, principalmente aquela difundida em tempos dolorosos como foi o do regime militar. E por isso a arte tem a sua função política quando seus criadores mantêm contato com as massas. Talvez o maior exemplo de um artista que tenha sido tanto subjetivo como crítico e politizador tenha sido Diego Rivera que sabia expressar com seu pincel tanto a sua individualidade, a sua visão artística quanto à apresentação das questões sociais.

Embora a tropicália tenha trazido aspectos importantes para a música brasileira, esse movimento pecou quando no momento em que o Brasil vivia uma ditadura se preocupou mais com uma arte filosófica do que com uma arte que mostrasse ao povo que se deveria lutar contra o regime. Seus membros apoiaram a modernidade burguesa e assim passaram a defender os presidentes que adotassem uma política de abertura. Dedicavam-se a uma luta pacifista para o fim da ditadura militar.

As brigas entre "patrulhas ideológicas" e "patrulhas odaras" pode dar a impressão que os tropicalistas não simpatizavam com a esquerda. Em algumas entrevistas Caetano listava o nome de seus críticos e chamava-os de comunistas. Mesmo que não fosse intencional, acabou sendo um erro, pois, naquela época a caça aos comunistas era pesada e o que ele fez nada mais foi do que uma delação colocando em risco a vida dos que foram citados. Tárik de Souza afirmava que Odara significava "largar tudo, esquecer a luta política para dançar".³ Os cantores tropicalistas estavam mais preocupados com a vendagem de discos do que com a situação política do país, o que não é muito diferente da esmagadora maioria dos artistas de hoje que estão na mídia. Tom Zé é a única remanescência do tropicalismo que se preocupou com a arte e não a sua comercialização.

NOTAS:
0- O Rebelde do Traço - A Vida de Henfil (p.353)
1- Extraído do livro de Carlos Alberto M. Pereira e Heloísa Buarque de
Holanda: Patrulhas Ideológicas Marca Reg.
2- Conceitos da Arte Moderna (p. 101)
3- O Rebelde do Traço - A Vida de Henfil (p.358)


Referência Bibliográfica:
COELHO, Cláudio N. P. - A Tropicália: Cultura e Política nos Anos 60. http://www.fflch.usp.br/sociologia/revistas/tempo-social/v1-2/coelho.htm

MORAES, Denis de. O Rebelde do Traço - A Vida de Henfil. Rio de Janeiro,
José Olympio Editora, 1996.

NAVES, Santuza Cambraia. Da Bossa Nova À Tropicália. Rio de Janeiro. Jorge
Zahar Editor, 2001.

STANGOS, Nikas. Conceitos da Arte Moderna (pág. 100,101 e 102).

Patrulhas Ideológicas: http://acd.ufrj.br/pacc/literaria/patrideol.html


Por Vinni Corrêa

8 comentários:

  1. Tenho nojo: Caetano, Gil e o lixo tropicalista. Argh, credo!

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  2. Concordo Senna, lixo cultura, empobreceu a culura brasileira....

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  3. Legal o texto meu amigo Yuri.

    Ponto de vista bem defendido. Mas não esqueça que é só um ponto de vista...

    Minha critica a sua critica:

    Tudo bem, vocês acharem que a arte deva tambem ter um papel social, visto que inspira, esclarece e movimenta o povo.
    Mas achar que ela deva ter essa função a-priori é reduzi-la.


    Tropicalia foi e é para a elite.
    Essa elite não é necessariamente burguesa. São das pessoas que se intereçam por questões de sensibilidade e que utiliza-se da capacidade subjetiva para unir os detalhes da obra e compreende-la apartir de um esforço proprio, tendo assim uma relação ativa no entendimento da arte, enquanto a maioria percebe apenas o que é mastigado e vomitado para remete-los a seus amores de novela ou as suas crises de consumo.

    Achei bacana a critica em relação ao contexto da ditadura. Mas convenhamos, sua óptica é treinada para achar falhas no carater revolucionario nas pessoas. É claro que a baianada queria vender disco. Mas para isso eles não emporcavam suas musicas para o povo decorar.

    O movimento tropicalista acabou mas a obra ainda exite. Entenda com o contexto mas saiba que ela tencende o seu tempo.
    Claro que eu respeito aqueles que choraram as magoas pela ditadura militar hoje. O país sangrou pra que militares enriquecessem.
    Mas ver a época da ditadura apenas como a época da ditadura é excluir todos os outros "Brasis" que existiam naquele momento. Não estou sendo relativista, só não quero que ser reducionista.

    Eu prefiro viver "o agora" e chorar as magoas do agora. Não são tão explicitas, visto que os regimes opressores decobriram que são ineficientes. É mais facil fazer o povo amar sua prisão e achar que um dia vai ser feliz no consumo.

    A musica para "a elite" proporciona o desenvoilvimento critico e da subjetividade.
    Possibilitando as pessoas a reproduzirem menos e criar mais.

    Os Novos Baianos, Gil, Caetano, Betania, Dorival etc... Romperam com o status saudosista da bossa nova. Prodizindo um grande movimento criativo e Brasileiro.

    Vocês que não gostam de musicas brasileiras pensem no que reproduzem e escutem com mais carinho.

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  4. Gostei do site fala coisas legais sobre a espoca do tropicalismo....

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  5. legal,fala coisas legais da epoca do tropicalismo!

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  6. http://www.fflch.usp.br/sociologia/temposocial/site/images/stories/edicoes/v012/a_tropicalia.pdf

    Legal sua visão, mas acho simplista demais, aqui tem um artigo da revista "tempo social" da USP, em que o autor Claudio N.P Coelho, apresenta outros aspectos, com interpretações das letras e trechos de entrevistas, tem 7 paginas só e é bem elucidativo. Na verdade quebra essa teori de tropicalia a parte da politica e contra a esquerda, leiam!
    http://www.fflch.usp.br/sociologia/temposocial/site/images/stories/edicoes/v012/a_tropicalia.pdf

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  7. Depois de ler o artigo do Claudio Coelho e o seu texto li esse do sociologo, professor da UFG, acho que mostra bem as interpretações suas e a do Claudio, ta bem interessante e mostra outro carater da tropicalia, na verdade um dos textos mais sensatos sobre o assunto muito bom, fala de como a tropicalia se analisada politicamente acaba sendo taxada de revolucionaria por uns e considerada conservadora por outros etc... leiam se quiserem, busquem conhecimento (BILU, et)
    http://informecritica.blogspot.com.br/2011/01/tropicalismo-e-politica.html

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