O estudioso da cultura, Stuart Hall, jamaicano que reside na Inglaterra desde a década de 1950, em seu livro A identidade cultural na pós modernidade, inicia sua reflexão a partir de questões envoltas nas indagações sobre a crise da identidade.
Hall trabalha três concepções de
identidade. Primeiro o sujeito do Iluminismo; depois o sujeito sociológico; por
fim, o sujeito moderno. E afirma que “a identidade plenamente unificada,
completa, segura e coerente é uma fantasia.” A máxima de Marx de que “tudo que
é sólido se desmancha no ar” é retomada.
Ao expor a construção do sujeito
moderno, o autor lembra a importância de Descartes com seu “cogito, ergo sum”
(penso, logo existo). O sujeito cartesiano como centro do conhecimento. Recorda
ainda John Locke ao desenvolver a relação de sujeito e sujeitado. Porém, a
partir de Lanclau, expõe que as sociedades modernas não possuem um centro, por
conta dos deslocamentos. Existe uma pluralidade de centros.
Na sequência o texto descontrói,
ao abordar o descentramento, estas concepções de sujeitos e identidades
modernos:
• Escritores como Baudelaire e
Kafka que prenunciam o que aconteceria com o sujeito cartesiano e com o sujeito
sociológico na modernidade tardia. “Solitários na multidão”; “vítima anônima
confrontada por uma burocracia sem rosto”. “Os homens fazem a história, mas
apenas sob condições que lhes são dadas”, dizia Karl Marx. Assim, deslocou duas
proposições-chave da filosofia moderna: 1º, que há uma essência universal de
homem; 2º, que essa essência é o atributo de “cada indivíduo singular”, o qual
é sujeito real.
• O descentramento em Freud e Lacan também é identificado, especialmente com suas análises sobre o desenvolvimento do sujeito na infância principalmente, com a “fase do espelho”, “o imaginário” e a questão do inconsciente.
• Na sequência Hall discute
Ferdinand de Saussurre, linguista estrutural, que afirma que nossa identidade
está intimamente ligada à língua, nos expressamos, pensamos, construímos representações
dentro de seus limites, e é claro, a língua também muda, portanto os sujeitos
mudam com a língua.
• Foucault e o regimes
disciplinares também contribuem para entendermos o descentramento dos sujeitos
ao esclarecer a dominação para que o sujeito torne-se dócil e obediente.
• O ano de 1968 aparece com o
quinto item, pois, os movimentos sociais expuseram “uma identidade para cada
movimento”. Especialmente o movimento feminista com sua abrangência.
Na segunda parte do livro, a
partir do capítulo 03, Hall discute as identidades culturais, “aqueles aspectos
de nossas identidades que surgem de nosso ‘pertencimento’ a culturas étnicas,
raciais, linguísticas, religiosas e, acima de tudo nacionais.”
Uma nação é uma comunidade simbólica, afirma o
autor. E as nacionalidades tem sido deslocada pelos processos de globalização.
“A vida das nações, da mesma forma que a dos homens, é vivida, em grande parte,
na imaginação”, citando Powell. Sendo que os elementos constitutivos de uma
nação imaginada seriam: a narrativa da nação; continuidade, na tradição e na atemporalidade;
invenção da tradição; mito fundacional; ideias de um povo puro, original.
Após mostrar como se constitui a
“cultura nacional”, Hall passa à desconstrução. Recorda que a cultura nacional
além de ponto de lealdade, união e identificação simbólica é uma estrutura de
poder e que “as nações modernas são, todas, híbridas”, citando alguns exemplos
como Itália, Inglaterra, França e Alemanha. A cultura nacional busca costurar
as diferenças culturais.
Abordando a globalização e as
identidades o autor afirma que a globalização não é um fenômeno recente e o que
o capitalismo nunca foi nacional, mas, observamos a acentuação da globalização
e da internacionalização a partir da década de 1970. E aponta três possíveis
consequências desses processos.
1º As identidades nacionais estão
de desintegrando, como resultado do crescimento da homogeneização cultural da
“pós-moderno global”.
2º As identidades nacionais e
outras identidades “locais” ou particularidades estão sendo reforçadas pela
resistência à globalização.
3º As identidades nacionais estão
em declínio, mas as novas identidades – híbridas – estão tomando seu lugar.
As críticas à possibilidade de
homogeneização estão prevalecendo na globalização. Afinal, o “local” não
desapareceu, temos novas articulações entre o “global” e o “local”. A
globalização também é desigual, tem alcance desigual. E ainda, temos que a
globalização é um processo de ocidentalização.
As migrações legais ou não pós II
Guerra Mundial, pós descolonização, levaram a pluralização de culturas
nacionais e de identidades. Os Estados Unidos com mexicanos, coreanos,
brasileiros... a França com senegaleses, argelinos... A Inglaterra com
quenianos, caribenhos, paquistaneses... entre outros. As tradições culturais
são confrontadas com as transformações da globalização, assim, temos
identidades alargadas, resinificadas. Os sujeitos migrados conservam ou tentam
conservar suas tradições de origem, mas dialogam com a cultura do local para
onde foram e o local que os recebe querendo ou não vai receber influências
desta outra cultura do migrante, nesta dialética das identidades.
As belas palavras de Rushdie, ao
defender seu livro Versos Satânicos –
que incomodou por apontar as mudanças na tradição – quanto ao hibridismo, é
trabalho nas considerações últimas do texto. Hall diz que, contrariando as
“metanarrativas”, “a globalização não parece estar produzindo nem o triunfo do
‘global’ nem a persistência, em sua velha forma nacionalista, do ‘local’.”
REFERÊNCIAS
HALL, Stuart. Identidades Culturais na Pós-Modernidade.
Rio de Janeiro: DP&A, 1997.
Prof. Cleiton Donizete Corrêa Tereza (Professor de História da Rede Municipal
de Poços de Caldas e da Rede Estadual de Minas Gerais, especialista em História
Contemporânea pela PUC Minas e membro do grupo de estudos “Cidadania, Direitos
e Educação” – USP).
Excelente ... Parabéns Prof Cleiton.
ResponderExcluirHugo F C Faco
Muito bom, Cleiton.
ResponderExcluirTenho orgulho de ser sua colega.
Saudades. Beijo.
Gostei do texto. Direto, pequeno e informativo.
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